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segunda-feira, 27 de junho de 2016
Das minhas inseguranças
Foram muitos anos a ignorar o espelho do quarto e a balança da casa de banho.
Foram muitos anos a aceitar que eu era tão grande que só a roupa de velha me servia.
Foram muitos anos a fingir que isso não me incomodava.
Foram muitos anos a cultivar a política da baixa autoestima.
Foram muitos anos a tratar o meu corpo como um balde do lixo.
E depois nasceu a minha filhota. Aquela que observava todos os meus passos. Aquela que sorvia todos os meus ensinamentos, mesmo os mais ínfimos. Aquela para quem eu tinha de ser a melhor.
E eu mudei.
Quis mudar porque ela merecia ter o melhor role-model que eu lhe pudesse dar.
Quis mudar porque eu merecia ser o melhor que eu pudesse ser. Eu merecia ser feliz em todos os aspetos da minha vida.
E continuo a mudar todos os dias. Às vezes para melhor, outras para pior...
Mas foram muitos anos a enxovalhar-me a mim própria e continua a ser difícil olhar para o espelho do quarto.
Eu olho para o espelho e o que vejo é a celulite das coxas, o inchaço dos tornozelos, as estrias da barriga, o peito descaído, os braços flácidos...
É muito a custo que consigo ver como gosto do meu nariz empinado, como gosto dos meus lábios perfeitinhos, como gosto dos meus pés, como gosto do tamanho do meu peito, como gosto do meu pescoço. E foi só quando a minha filha me disse que gostava de ter os olhos da cor dos meus é que eu me apercebi como eles eram bonitos...
Eu ainda olho para o espelho e só consigo ver que as minhas ancas continuam largas, que as minhas coxas continuam grossas e que o pneuzinho da barriga continua inflado.
É a muito custo que consigo admitir que apesar de toda essa "anormalidade" e "enormidade", o meu corpo mantém as proporções harmoniosas que realmente tornam uma mulher bonita.
Roliça sim, mas harmoniosa.
Olhando à volta, todos os dias somos bombardeadas com imagens de corpos perfeitos...
As lojas da moda determinam se és "boa" o suficiente para teres o privilégio de comprares as suas roupas, ou se o tamanho maior não te passa dos joelhos...
Os espelhos dos provadores... ahh os espelhos dos provadores, fujo deles a sete pés... não há uma vez em que eu me olhe num espelho desses e não pense: Como é que saíste assim de casa, mulher?!
Os piropos... esses estão reservados para as que são mesmo "boas"...
E quando recebes algum, mesmo assim pensas que estão no gozo contigo... não consegues acreditar que seja dito de coração, simplesmente porque não te vês como "Boa!"... é preciso quase uma dissertação sobre o tema para acreditares :)
E depois há dias em que olhas descontraidamente para um qualquer espelho num corredor de um shopping e pensas Eh lá! Estas calças ficam-me bem... pareço mais magra... porque se calhar até estás a ver aí o que todos os outros veem! Porque o raio da imagem que vês refletida no espelho do quarto não é a imagem que os outros têm de ti.
Porque se tu um dia não viste como eras enorme aos 98 - e eu juro pelas alminhas que nunca vi no espelho a mulher que hoje vejo em fotos daquela época - se calhar a imagem que vês no espelho continua a ser uma imagem distorcida de ti.
O hubby esteve ao meu lado em praticamente todas as fases da minha vida, desde a melhor à pior e sempre me disse que eu sou perfeita como sou. Que não se importa com o meu tamanho, que me ama a mim, pelo que sou, mas que compreende que se eu não me sinto bem, trabalhe para o modificar e me apoia incondicionalmente.
E eu dou por mim a pensar: desperdicei tantos anos da minha vida descontente com o que vejo no espelho porque não chega nem perto dos padrões "ideais" quando podia ter simplesmente ter feito as pazes comigo e aceitar-me e amar-me como sou...
Apesar disso, apesar de eu já ter mudado tanto o meu modo de vida, o meu modo de pensar, apesar de começar a fazer as pazes comigo, eu ainda não consigo olhar-me no espelho sem me focar nos meus pontos negativos. Porque no fim de contas, eu estou tão longe do que a sociedade definiu como "ideal"...
E depois há a perspetiva descomplicada dos homens sobre o assunto... este chorrilho de dúvidas, deve ser completamente incompreensível para eles...
Eles realmente devem olhar para nós com a cabecinha de lado, tal qual os cachorrinhos quando não percebem o que estamos a fazer.
- Queres comer? Come.
- Sentes-te pesada? Mexe-te.
- Se não te sentes bem, faz algo quanto a isso. Agora, não vale a pena andares só a chafurdar em auto-comiseração, sem mexer uma palha.
- Para que te martirizas?!
Simples assim...
Acho que muitas vezes me vi assim, com inseguranças e achei tão bonita a ideia de no olhar de uma filha nos descobrirmos melhores
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